NUM BELO DIA... VIRAMOS ABÓBORAS!

   Escrito por Sonia B. Hoffmann

Quantas e quantas vezes ficamos "matutando" para fazer e dizer as coisas certas e tentar evitar o máximo possível polêmicas, melindres, mágoas e insatisfações desnecessárias ou improdutivas naquele momento em nosso ambiente familiar, laboral e social?

Para isto, não raro lançamos mão de silêncios, desculpas, afastamentos e até mesmo da tão conhecida "mentirinha piedosa" a fim de amenizar situações. Nem sempre, no entanto, estes nossos estratagemas são interpretados pelas outras pessoas da mesma forma ou mesmo objetivo pelo qual os adotamos e a confusão está feita! Na maioria das vezes, elas ficam melindradas conosco e, prontamente, a imaginação fértil é detonada em algum ponto da inteligência, e porque não do instinto, surgindo verdadeiras pérolas de elocubrações, fantasias ou quaisquer outras hipóteses - menos aquelas razões que realmente sustentam o nosso comportamento.

Diremos, então, que não somos compreendidos e, muitas vezes, nos colocamos em uma posição de vitimização e mesmo de mártires, desconhecendo a enorme dificuldade dos outros em decodificarem o lógico, o óbvio. Tal qual uma bola de neve, comportamentos contraditórios chocam-se e vão aumentando o distanciamento. Aparecem novas mágoas, surgem diferentes desculpas e as melancias desajeitam-se no andar da carruagem... e deixamos de ser príncipes ou princesas, tornando-nos abóboras que devem ser atiradas aos porcos ou serem decoradas para o festejo do Dia das Bruxas.

Em algumas circunstâncias, contudo, muitos de nós nos impactamos diante da reação do familiar magoado, do colega despeitado, do companheiro entristecido frente a nossa conduta, opinião ou da pretensa "desfeita". Digo impactados porque a nossa intenção realmente não foi a de causar mágoa, despeito, tristeza. Justamente o oposto. Para evitar a discórdia, a insatisfação ou a opressão em fazermos algo que não temos nenhuma vontade ou por considerarmos que aquele evento irá resultar nestas possibilidades, adiamos a decisão ou abrimos um espaço para que o outro não realize a ação ou a repense. a partir da sua própria iniciativa. Tentamos abrir um espaço onde também esta pessoa perceba-se como um ser tão falível quanto nós e com a habilidade para o entendimento e a reorganização de seus planos, perspectivas e convites - considerando sempre que também temos direito ao livre-arbítrio e à vontade ou não de fazer, dizer ou pensar alguma outra coisa que não seja somente aquilo que esperam de nós.

Me questiono, porém, se não estamos sendo muito exigentes com o outro em sua capacidade de compreensão e captação de nossos motivos, para além daquilo que julgam ter ouvido ou visto. A fim de não enveredar pelos caminhos e descaminhos de intrigas, controvérsias, embates e julgamentos estressantes, uma atitude interessante e inteligente não seria a exposição com serenidade, prudência e honestidade das nossas razões, sem a busca constante de subterfúgios?

Há pessoas que não gostam de palavras cruzadas, que não sabem ou não querem brincar de quebra-cabeças e que não permitem-se alargar seu poder de sensibilidade. Ou seja, há pessoas que desconhecem um mundo fora do seu mundo. Portanto, se não é possível uma conversa franca e direta espontaneamente, quem sabe nos munimos com diferentes modos de ser o mais verdadeiros através do tom de voz, da argumentação simples, da aceitação de que desentendimentos e recusas irão certamente em algum momento acontecer e de que, nem por isto, precisamos estremecer relações, enfartar ou agir tal qual criança mimada e acabar com a brincadeira, levando embora a bola ou a boneca.

Então, ao invés daquela mentirinha de que estamos com "uma dor de barriga sideral", dizemos simplesmente "sei que um encontro entre nós será ótimo, mas sou alérgica a pelos de cachorro e estou estressada para ouvir gritos... por que não fazemos o encontro aqui em casa ou em um local mais silencioso?" Ou, em lugar de fecharmos a questão em "já tenho um outro compromisso", ponderamos apenas "um almoço reunindo toda a família é uma ideia bastante interessante, mas para evitar os constrangimentos já acontecidos em outros eventos, não será melhor pensarmos em promover atividades lúdicas para motivar a participação de todos e desmotivar o surgimento do tédio e da fofoca?".

Uma vez, li em algum dos textos de Rubem Alves que deveríamos ter em nossa sala uma caixa de brinquedos. Entendo que, quando as visitas chegassem, a conversa fosse esmorecendo e desvirtuasse para pontos desagradáveis, prudentemente tiramos uma carta da manga e tchan-tchan-tchan... abrimos a tal caixa e de lá saltam piorras, baralhos, dominó, damas, carrinhos de brinquedo, bonecas de pano, fantoches e tantas e tantas outras criatividades. Que divertido será então o nosso encontro. Já estou até ouvindo as risadas, as apostas, as entonações de artistas, mágicos, cantadores e encantadores!

Assim, caríssimos e caríssimas, será que não podemos deixar a vida ser conduzida de maneira mais leve, franca e menos angustiante; com menos queixas, com menos medos e mais alegria e oportunidades de crescimento?


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